quinta-feira, julho 08, 2010

written in reverse

e o amor era um verbo, uma coisa tão simples quanto ligar a lâmpada, colocar o disco pra girar e segurar o cinco da discagem rápida. Decorar o telefone dos táxis, aprender a desabotoar sutiãs novos e rir dos seus livros imbecis ou da sua incapacidade de ouvir um disco inteiro. Ou fingir acostumar com seus hábitos de reeducação alimentar e comer só uma fatia de pizza ou encher os copos de suco pela metade. E chamar isso de amor. E ver você cruzar a rua enquanto coloco meus fones e deixo o shuffle decidir se o dia foi bom ou ruim.

Na primeira semana tocou  Yer Blues umas quatro vezes e eu sabia que tinha alguma coisa errada. Mas de vez em quando a gente precisa cometer uns erros pra descansar um pouco de estar sempre certo. Até o dia que eu canso de descansar a cabeça ou algum fantasma me lembra que isso não é amor, parece amor igual um quarto cheio de vácuo e um cheio de ar parecem os mesmos. Você quer ser a solução de todos os meus problemas, pagar minhas contas, me ensinar a colocar tudo no débito automático, dobrar minhas camisetas, não deixar eu pisar no gelado, brincar com os fósforos ou dormir com as janelas abertas enquanto tudo que eu quero é alguém que esteja pouco se fodendo pra minha saúde, que queira me tirar de casa às quatro da manhã e não devolver a tempo pro café da manhã.

Você não é resposta alguma, talvez tenha sido quando as perguntas eram outras, mas passou. Você quer ser Penélope mas você não passa de Circe. Eu espero que você seja feliz, encontre outras pessoas dispostas a aceitar o seu tipo de amor. Eu quero o risco, quero as perguntas sem respostas, quero as garotas que eu ainda não vi, os carnavais e filmes perdidos.

Você não percebe que cada dia desde que você voltou tem sido nossa história em reverso, primeiro te levo no mesmo lugar que da última vez. Voltamos ao mesmo cinema e é quase o mesmo filme, voltamos aos mesmos restaurantes enquanto eu costuro simetricamente a mesma história e assim saio do seu labirinto. A última vez foi o mesmo beijo da primeira, na mesma cama, a mesma música, a mesma lâmpada e eu saio pra nunca mais voltar, fumo meu último primeiro cigarro da marca que não existe mais, disco os mesmos números num telefone novo enquanto você se pergunta de onde vem esse sorriso antigo na minha cara e eu deixo a porta bater.